terça-feira, 17 de novembro de 2009

O culto que agrada a Deus


“...para que fiques ciente de como se deve proceder na casa de Deus” 1 Timóteo 3.15

Nossa ênfase no mês de novembro é a temática da adoração: “descobrindo e preparando líderes para a adoração em espírito e em verdade”, com isso visando o aperfeiçoamento dos santos.

O templo foi construído, dedicado e destinado para o culto público a Deus. E, sendo o culto oferecido a Deus, é a Ele que aquele deve agradar e não aos caprichos e gostos humanos. Quem reclama que certo culto não o agradou ainda não compreendeu o sentido da adoração genuína e bíblica; faz-se cliente e não adorador; deus e não criatura; usurpa uma prerrogativa divina! Por outro lado, quem faz o que bem quer no culto, também incorre nos mesmos equívocos. Tenho visto muito crente embirrado, não raro com eventos absolutamente excepcionais em cultos, fazendo assim as vezes de deus!

Mesmo que uma normatização de culto não seja da competência humana, ganharemos muito em abordar algumas questões práticas e controvertidas: os instrumentos musicais, as roupas, o aplauso, os alimentos e as iguarias (chicle)... Isso faremos nos próximos domingos.

A maior parte destas questões deve ser abordada e julgada não tanto pela espiritualidade que poderia revelar, ou a correção doutrinária batista, mas muito mais pelo gosto, pela faculdade de julgar os valores estéticos segundo critérios pessoais e subjetivos. E quando se trata de gosto ou preferência pessoal só há unanimidade no cemitério. Onde há vida e seres vivos aí haverá opiniões e visões divergentes. E, contudo fomos chamados a experimentar a unidade na diversidade neste organismo chamado “Corpo de Cristo” (note, não o corpo de José, ou o de Maria ou ainda de outro). Quem quer impor o seu gosto pessoal sobre uma coletividade está demonstrando vocação para ermitão e não para membro de um grupo.

O que é estabelecido biblicamente como princípio geral é que o culto é destinado a Deus e o que Deus sobretudo busca é a atitude mental e corporal corretas. Ora, o nosso corpo fala e revela sobre os nossos sentimentos os mais íntimos. Guardadas as devidas proporções é possível identificar imediatamente quem está adorando genuinamente pela postura facial e corporal! Deus procura adoradores com a atitude correta (Isaías 1.10ss) que o adorem em espírito e em verdade (João 4.23-24).


II


Uma das posições mais enfocadas na controvérsia quanto ao uso de instrumentos musicais no culto parece ser aquela que julga alguns instrumentos como espiritual e doutrinariamente corretos e apropriados para o culto (órgão e piano) e outros como absolutamente inadequados e não espirituais (bateria, guitarra). A pergunta é se uma posição que busca apoio bíblico, doutrinário ou divino para adoção de certos instrumentos e recusa de outros terá bom êxito ou se a matéria é na verdade uma questão de gosto ou preferência pessoal, i.é., se a questão deve ser julgada a partir da faculdade de julgar os valores estéticos segundo critérios pessoais e subjetivos.

Uma verdade é clara: não há uma doutrina batista a respeito do uso de instrumentos musicais no culto, essa é uma questão do gosto de cada igreja local. Por outro lado usar o argumento da “tradição batista” como alguns o fazem, soa absolutamente contraditório, pois os batistas têm defendido, nos mais de 400 anos de história, a absoluta autoridade das Escrituras Sagradas em questões de fé e prática e não de alguma tradição. Tradições, mesmo as melhores, não são normativas para batistas!

Haverá então na Bíblia um “princípio regulador do culto” no que tange ao uso de instrumentos musicais? Várias autoridades idôneas da área teológica* elaboram uma consistente e curiosa posição bíblica sobre o assunto: “Adão e Eva, que adoraram a Deus antes da queda, usaram apenas suas vozes em louvor a Deus. Esta afirmação é provada pelo fato de que instrumentos musicais não foram inventados até oito gerações (Genesis 4.20-21)”. Temos no AT vários exemplos do uso de instrumentos musicais para o prazer pessoal, em celebrações de vitórias ou como trombetas de proclamações. Contudo a introdução e uso de instrumentos musicais na adoração pública, está conectada com o sistema sacrificial e foi um aspecto da Lei Cerimonial. Em suma o uso de instrumentos musicais na adoração pública era levítica, cerimonial e tipológica. Incenso, vestimentas, altares e instrumentos musicais faziam parte da adoração cerimonial do Antigo Testamento, como “sombras” ab-rogadas com a vinda de Cristo e, “visto que o Novo Testamento ensina que todos os aspectos cerimoniais de adoração do Templo foram abolidos, as passagens que falam do uso de instrumentos musicais no culto público, debaixo do Antigo Pacto, não providenciam sanção bíblica para o uso de instrumentos musicais na adoração pública hoje”. Comentando o salmo 71 João Calvino escreveu: “Cantar os louvores de Deus ao som da harpa e do saltério inquestionavelmente formava uma parte do aprendizado da lei e do serviço de Deus sob aquela dispensação de sombras e figuras; mas não devem agora ser usadas nas ações de graças públicas.” (Salmos 3, Pg. 65). No culto no templo eles foram usados por sacerdotes e levitas e não foram usados na Sinagoga Judaica até 1810 d.C. na Alemanha. Já o NT silencia de forma absoluta a respeito do uso de instrumentos no culto. Por isso conclui Schwertley: “Os cristãos não podem mais ter interesses em usar instrumentos musicais no culto público do que usar vestimentas sacerdotais, velas, incenso, altares e um sacerdócio sacerdotal”. Concluí-se que na Bíblia não há sanção para uso de bateria e guitarra no culto público no templo, como também para o uso de piano ou órgão. Se quisermos ser literalistas não há outro caminho senão abolir todos os instrumentos musicais e retornar ao louvor apenas com as vozes no melhor estilo gregoriano.

Instrumentos musicais no culto público são, entretanto, excelentes apoios à adoração vocal, portanto uma questão de necessidade prática. A adoção dos diferentes tipos de instrumentos musicais são uma questão de gosto e preferência e devem seguir os critérios de bom senso, cultura local e respeito à diversidade. Tolerância para com o gosto alheio é o único caminho para viabilizar a convivência cristã numa congregação onde a diversidade de gostos é inevitável.

Um visitante ilustre de gosto musical apurado comentou sobre uma cantata executada em nossa igreja: “Não me acrescentou nada, porque os instrumentos, principalmente os metais, me irritaram por estarem muitos altos e eu não conseguia ouvir as vozes e conseqüentemente entender a mensagem”. Neste exemplo, os instrumentos, embora tradicionais (não era bateria e guitarra), prestaram um desserviço ao culto pelo uso sem bom senso.

Vê-se que a questão pivotal não é este ou aquele instrumento, mas o bom senso no uso e a atitude correta de adoração.

*dentre elas: João Calvino, Salmos volumes 1, 2, 3 e 4. Série Comentários Bíblicos. Editora Fiel, São José dos Campos, 2009. Brian Schwertley, Os Instrumentos Musicais no Culto Público de Deus, Lansing, MI, 1998


III


À guisa de conclusão sobre o assunto tratado na pastoral do último domingo, a respeito das posições antagônicas e polarizadas do uso de instrumentos musicais no culto: “bateria e guitarra versus piano e órgão”, reitero que não há uma doutrina batista a respeito do assunto e que não se pode como batista buscar sanção em uma pretensa “tradição” para uma posição mais conservadora que rejeite o uso de instrumentos musicais contemporâneos, tendo em vista que a maior tradição batista é exatamente não seguir tradições humanas em questões de fé e prática. Tal verdade desautoriza a rejeição/aceitação de instrumentos musicais sob alegação de serem ou não serem batistas.

Além disso, verificamos que a Bíblia não oferece sanção para uso de quaisquer instrumentos musicais no culto público no templo, haja vista estarem as padronizações registradas no Antigo Testamento ligadas ao sistema sacrificial e cerimonial do Antigo Pacto, como sombras, ab—rogadas com a vinda e morte de Cristo. Tais padronizações incluíam além de determinados instrumentos musicais, vestimentas sacerdotais, velas, incenso, altares e um sacerdócio sacrificial. Tentar fundamentar preferências por instrumentos musicais na Bíblia, como por exemplo, no Salmo 150, exigiria a busca frustrada de reprodução rigorosa daqueles instrumentos musicais ali citados, inclusive os barulhentos “címbalos altissonantes”, e legitimaria os famigerados atuais grupos de coreografia, por conta da expressão do verso 4: “louvai-o com adufe e com danças”. Em suma, se baseio minhas preferências por certos instrumentos musicais no Salmo 150 ou na Bíblia, não posso deixar de admitir tudo o que é citado neste salmo, incluindo danças. Mas, a Bíblia, ou o Salmo 150 não oferecem sanção para uso de quaisquer instrumentos musicais no culto público no templo hoje e a intenção do Salmo 150 é bem outra! Uma interpretação rigorosamente bíblica desautoriza a rejeição/aceitação de instrumentos musicais sob alegação de serem ou não serem bíblicos.

Instrumentos musicais no culto público no templo são excelentes apoios à adoração vocal e portanto uma questão de necessidade prática inspiradora. E a adoção dos diferentes tipos de instrumentos musicais é uma questão de gosto e preferência e o seu uso deve seguir os critérios de bom senso, respeito à diversidade e cultura local.

O bom senso manda usar o instrumento musical sem suplantar as vozes; ele deve servir apenas de apoio. Já o princípio da diversidade deve levar à compreensão de que uma congregação composta de diversas faixas etárias e diversos gostos musicais só poderá subsistir com uma relação de equilíbrio entre os diferentes gostos. Sem privilegiar uns em detrimento de outros.

Por último, temos a cultura local. Com isso me refiro ao jeito Memorial de ser. A cultura da Memorial em termos de instrumentos musicais é equilibrada. O louvor é acompanhado ora apenas com instrumentos clássicos, ora também com instrumentos contemporâneos, respeitando assim a diversidade de sua congregação. Queremos que todas as gerações e todos os gostos sejam aqui contemplados com bom senso e equilíbrio e encontrem no Templo Memorial “ninho para si”.

Chamados a adorar não apenas sozinhos e isolados, mas unidos e em família, que encontremos sempre aqui a instância adequada de equilíbrio, bom senso, tolerância e edificação mútua. Que a unidade na diversidade dignifique o Deus da “multiforme sabedoria” (Efésios 3.10).

Pr. Josué Mello Salgado

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