sexta-feira, 21 de agosto de 2009

Cristianismo e Literatura


C. S. Lewis, ao ser questionado sobre se Teologia é Poesia, respondeu que não (o texto da resposta está contida do livro O peso de Glória). No entanto, não há dúvidas de que idéias teológicas podem ser veiculadas sob a forma literária. O próprio C. S. Lewis utilizou a ficção para transmitir idéias teológicas bastante relevantes e profundas. As Crônicas de Narnia são um belo exemplo de como a Literatura pode exprimir mensagens bíblicas de uma forma simples e didática. Além das Crônicas, é possível ressaltar dentro da obra de Lewis o conto O Grande Abismo e sua Trilogia Espacial.


A Bíblia mesmo usa em diversas vezes a Literatura para expressar as verdades a respeito de Deus e de sua relação com o homem. Conforme o comentarista das Escrituras:


"Repetidas vezes, o Antigo Testamento irrompe em poesia. Até mesmo as suas narrativas são ornadas aqui e ali com uma parelha de versos, ou com uma seqüência mais longa de versos para ressaltar qualquer fato memorável (...), e esta é a forma que, de modo predominante, suas profecias assumem. Embora os Salmos formem o corpo principal de poesias nas Escrituras, (...) eles mesmos estão cercados por poesia e estão arraigados numa tradição poética longa e popular" (Kidner, Derek. Salmos 1-72: introdução e comentário. São Paulo: Vida Nova, 1992)


Dois livros do Antigo Testamento, em especial, são compostos por poemas, os Salmos e Cântico dos Cânticos. No Novo Testamento, os evangelhos mostram que Jesus freqüentemente lançava mão de um tipo de texto literário chamado "parábola" de forma a ilustrar vários de seus ensinamentos. Segundo Bailey: "As parábolas de Jesus são uma forma concreta e dramática de linguagem teológica que força o ouvinte a reagir. Elas revelam a natureza do reino de Deus e/ou indicam como um filho do reino deve agir" (Bailey, Kenneth. As parábolas de Lucas. São Paulo: Vida Nova, 1995, p. 14). É bastante significativo que Jesus tenha usado a Literatura como forma preferencial de exposição das verdades do Reino de Deus, considerando que Ele é o modelo de Mestre para os cristãos. Nesse sentido, os ensinamentos de Cristo apontam para o fato de que determinadas idéias teológicas só podem ser bem expressas literariamente.


A propósito, poderíamos trazer um grande número de exemplos de obras literárias que veiculam importantes idéias teológicas: A Divina Comédia de Dante aborda aspectos da soteriologia e da doutrina do pecado; O Paraíso Perdido de Milton fala sobre a natureza do mal e da idéia de rebelião contra Deus; vários do romances e novelas de Tolstói e Dostoiévski tratam de assuntos bastante afetos à doutrina cristã. Dostoiévski, nesse sentido, acreditava que a arte literária tinha uma missão cristã relevantíssima em seu contexto ao se contrapor ao niilismo ateísta nascente na Rússia do século XIX, decorrente da importação das idéias revolucionárias européias.


A eficiência da arte literária para expor e divulgar idéias teológicas pode ser exemplificada pelo relato de Muggeridge citado por Philip Yancey em seu livro Alma Sobrevivente:


" No início da década de 1970, Malcolm Muggeridge ouviu, para sua surpresa, que membros da elite intelectual da União Soviética, ainda sobre o regime comunista, estavam experimentando um reavivamento espiritual. Um dissidente russo que vivia exilado na Inglaterra disse-lhe que virtualmente todo escritor artista ou músico de renome estava explorando questões espirituais. Muggeridge relata: 'Perguntei-lhe como aquilo poderia estar acontecendo, dados os esforços de lavagem cerebral anti-religiosa sobre os cidadãos e a ausência de literatura cristã, inclusive os evangelhos. Sua resposta foi memorável. Ele disse que as autoridades esqueceram de suprimir as obras de Tolstói (1828-1910) e Dostoiésvki (1821-1881), as mais perfeitas exposições da fé cristã dos tempos modernos.'" (Yancey, Philip. Alma sobrevivente. São Paulo: Vida, 2004, p. 128)

Com isso, Yancey nos mostra que a preocupação de Dostoiéski com a missão cristã da literatura não foi em vão, pelo contrário, agiu significativamente na vida de muitas pessoas ao longo de várias gerações.


Um outro livro de Philip Yancey, Muito mais do que palavras, mostra como os mestres da Literatura influenciaram os escritores cristãos. Lá é possível verificar como o pensamento de autores como Eugene Peterson, de Madaleine L'Engle e do próprio Yancey foi influenciado por artistas como John Donne, Flannery O'Connor, Ray Bradbury, J. R. R. Tolkien. O fato de que a Literatura possui esse poder de influência sobre a cosmovisão dos leitores gera uma responsabilidade para o cristão: não desprezar essa forma de arte.


De fato, os textos literários têm a capacidade de expressar as verdades da fé de um modo tocante, inspirativo e instigante. Por isso, é preciso ler e fazer Literatura para a glória do Senhor. Tendo isso em mente, iniciaremos uma nova série de posts em que reproduziremos algumas obras importantes da Literatura brasileira e mundial dedicadas a inspirar o louvor a Deus e à reflexão sobre importantes temas do Cristianismo. A maioria de textos reproduzidos será de poemas em razão das limitações próprias do formato de um blog, porém ocasionalmente será possível reproduzir também pequenos textos em prosa. Esperamos que todos se sintam inspirados e motivados a fazer a cada vez mais a vontade de Deus por intermédio dessas obras memoráveis.

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